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23 de Abril de 2024

"Um artista estourando no TikTok é a pessoa mais vulnerável" — entenda a importância das licenças de direitos autorais sobre beats

Graças à tecnologia e à Internet, alcançar o público com sua música é muito mais fácil hoje. Mas o desconhecimento das leis de direitos autorais torna os artistas ainda mais vulneráveis diante da rápida proliferação de conteúdos.

Publicado por Ana Clara Ribeiro
há 3 anos

"Um artista que está estourando no TikTok é a pessoa mais vulnerável".

Essa frase não é minha, é do cantor e compositor Caleb Hearn, de uma entrevista concedida à revista Rolling Stone dos Estados Unidos.

A história de Caleb, infelizmente, já aconteceu com vários artistas.

Segundo a matéria de Elias Leight para a Rolling Stone, Caleb "comprou" um instrumental de piano na Internet, para usar como instrumental de uma composição autoral. (Mais à frente, você vai entender porque estou usando o verbo comprar entre aspas)

A composição, chamada "Always Be", tornou-se um sucesso após Caleb divulgá-la em sua conta da rede social TikTok.

No entanto, um empresário musical comprou os direitos sobre esse mesmo instrumental usado por Caleb, e assim, Caleb perdeu direitos sobre sua própria gravação e ainda passou a correr risco de copyright infringement (violação de direitos autorais).

man in gray t-shirt playing guitar

Créditos da imagem: Soundtrap, via Unsplash. Uso autorizado.

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A história é ainda mais delicada porque a letra e melodia de "Always Be" foram compostas por Caleb para homenagear um grande amigo que faleceu. Quando Caleb finalmente criou coragem para falar sobre o assunto, compor e publicar a música, inspirou várias pessoas a compartilharem suas histórias também.

O empresário que comprou os direitos sobre o instrumental usado por Caleb entrou em contato para trabalhar com ele, mas até o momento em que eu público esse artigo, em 28 de janeiro de 2021, a negociação não aconteceu.

Triste com a situação e sem poder usar a primeira gravação, sob risco de violar os direitos do novo dono do instrumental, Caleb regravou a música com outro instrumental. A nova gravação foi batizada de "Always Be 2.0" ou "Always Be 2020".

Por que isso aconteceu?

Aparentemente, Caleb Hearn não adquiriu todos os direitos sobre o instrumental de piano, deixando margem para que outra pessoa adquirisse esses direitos.

A história de Caleb, infelizmente, acontece com uma grande frequência e expõe a vulnerabilidade de artistas iniciantes, que não têm conhecimento de direitos autorais na área musical.

Acontece bastante no mundo do hip hop, um gênero musical em que os rappers ou trappers dependem muito das "beats" (trilhas instrumentais de batidas de hip hop criadas em softwares de produção musical).

Como é possível perceber, fazer e distribuir música, assim como conseguir sucesso, é muito mais fácil hoje, para quem tem acesso à Internet, equipamentos de home studio e um perfil em uma rede social.

Preciso ser justa: destacar-se e ganhar dinheiro com música continua sendo difícil, e uma exceção, pois a concorrência é alta e os royalties geralmente não são muito atrativos. Mas costumava ser imensamente mais difícil!

No início dos anos 2000, por exemplo, para ter sucesso com uma música era preciso ter a oportunidade de gravar em um estúdio profissional, ter um contrato com uma gravadora — e ainda torcer para que ela tivesse um bom orçamento para te divulgar em grandes mídias.

Entretanto, mesmo que a produção e distribuição de música tenha se tornado mais acessível, nem por isso os artistas deixam de correr riscos.

Por inexperiência ou descuido, muitos artistas perdem a chance de ganhar dinheiro com seu próprio trabalho. Além disso, muitos são vítimas de exploração.

No caso de Caleb, ele se encontrava sob dupla vulnerabilidade: do ponto de vista emocional (devido à perda do amigo, que inspirou a música) e do ponto de vista jurídico.

Mesmo o artista com a melhor visão de negócio pode passar pelo mesmo problema, se não estiver bem assessorado na área de direitos autorais.

Direitos autorais sobre instrumentais "comprados" na Internet

Atualmente, a venda ou licenciamento de beats (batidas) e trilhas instrumentais na Internet é uma das maiores fontes de renda para produtores musicais e beatmakers.

Também é uma alternativa acessível para cantores, rappers e compositores que não produzem, ou não têm como investir em produtores para criar algo sob demanda.

Essas negociações geralmente acontecem em plataformas específicas para isso, como a BeatStars ou TrakTrain. Também é comum que os beatmakers postem seus trabalhos em redes sociais, ou plataformas como Soundcloud e Youtube, e os interessados entrem em contato a partir dali.

É uma prática comum, e em tese, lícita.

Não há nada de ilícito em vender os direitos patrimoniais sobre beats. A legislação de direitos autorais permite isso.

Porém, é importante saber que:

  • pela lei brasileira de Direitos Autorais, não é possível vender a "autoria" de uma beat. Os direitos morais do autor, no Brasil, são inalienáveis, ou seja, não podem ser vendidos. Logo, quem compra a beat não pode ser creditado como produtor dela (embora, na prática, isso aconteça muito!);
  • quem "compra" uma beat precisa saber o que está comprando! E quem vende também precisa saber o que está vendendo. Um produtor ou beatmaker pode vender os seus direitos patrimoniais de autor. Mas é importante deixar esses termos bem claros. Muitas vezes, o que o artista está comprando é apenas uma licença para usar a beat por um tempo determinado, ou uma licença que não permite a distribuição em plataformas de streaming, por exemplo.

Por isso, tanto para quem faz e vende beats, quanto para quem as compra, é importantíssimo que sejam feitos os devidos contratos de cessão de direitos autorais.

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Este artigo tem a finalidade de informar, não equivalendo a consulta jurídica nem parecer sobre qualquer caso concreto.

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Confira também o artigo que publiquei no Justificando: "Propriedade Intelectual em tempos de TikTok", sobre direitos autorais, redes sociais, apropriação cultural e racismo.

  • Sobre o autorAdvogada de Propriedade Intelectual (foco em Marcas e Direitos Autorais)
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